Ficar mais de três horas por dia em frente à TV pode
ser fatal. Isso porque o hábito é considerado pano de fundo para várias doenças
Desligue a TV e vá ler um livro. Ou melhor, pode
continuar aqui lendo a SAÚDE. O importante mesmo é sair da frente da telinha. É
que, apesar de soar inofensivo, o hábito de ficar muito tempo na frente do
aparelho pode ser prejudicial à saúde. Exagero? Segundo uma nova revisão de
estudos da Escola Norueguesa de Ciências do Esporte, assistir a três horas ou
mais de televisão por dia está associado a um aumento de 93% no risco de morte
por qualquer causa.
Esse dado é particularmente preocupante para nós
brasileiros. Afinal, falamos do meio de comunicação e de entretenimento mais
utilizado por aqui. A última Pesquisa Brasileira de Mídia, conduzida pela
Secretaria de Comunicação da Presidência da República, mostrou que gastamos, em
média, quatro horas por dia diante da TV.
O excesso de tempo sentado é o principal vilão nessa
novela. E o objetivo inicial da equipe norueguesa era descobrir se a atividade
física poderia amenizar, ou até eliminar, os riscos atrelados a esse
comportamento. Os resultados apontaram que sim: é possível anular o perigo com,
no mínimo, uma hora de exercícios todo santo dia. O surpreendente, no entanto,
foi que mexer o esqueleto não diminuiu (muito menos fez desaparecer) a
probabilidade de piripaques entre as pessoas que dedicavam várias horas a
filmes, seriados e demais programas televisivos.
Foi aí que os cientistas notaram que o sofá não é o
único inimigo – outros hábitos pioram a situação. “Sentar em frente à TV pode
estimular atitudes ruins, como a ingestão de alimentos e bebidas pouco
saudáveis“, exemplifica o epidemiologista Ulf Ekelund, um dos responsáveis pela
revisão. Ou seja: três horinhas na sala ou no quarto olhando para o televisor
parecem ser mais nocivas do que aquelas horas na cadeira do escritório.
“Ainda que pouco, no trabalho você acaba se
movimentando para pegar um café, entregar um documento ou conversar com um
colega. Isso dificilmente ocorre quando se está vendo TV”, compara o educador
físico Raul Santos de Oliveira, da Universidade Federal de São Paulo. Para
muita gente, só faz sentido levantar no meio de um episódio da série predileta
se for para buscar um petisco – e, aí, o enredo se complica.
Outra agravante está no horário em que o corpo fica
inerte e com olhos vidrados. Na maioria das vezes, à noite, logo após o jantar.
Isso prejudica a ação de uma enzima chamada lipoproteína lipase, responsável
por eliminar as moléculas de gordura dos vasos sanguíneos. Essa falha favorece
o ganho de peso e torna o ambiente propício para um filme de terror no
organismo, com direito a maior probabilidade de infarto no final.
O conteúdo publicitário veiculado nas telas também
dá sua contribuição. Estudiosos da Universidade Federal dos Vales do
Jequitinhonha e Mucuri, em Minas Gerais, analisaram 239 propagandas de
alimentos e notaram que 85% dos produtos anunciados eram doces e fontes de
gorduras. Frutas, hortaliças e verduras nem sequer apareciam nos comerciais. “A
questão é que a mídia exerce grande influência em relação àquilo que
consumimos”, lembra o educador físico Grégore Mielke, da Universidade Federal
de Pelotas, no Rio Grande do Sul.
Mas não tem jeito. Precisamos retomar aquela
história de ficar horas a fio com as nádegas afundadas no sofá, já que o
conflito todo para o nosso corpo começa justamente aí. Para uma porção de
gente, esse comportamento faz parte da rotina e da profissão. Pode até parecer
bastante confortável, mas a realidade é que cada célula do organismo está
alvoroçada só esperando que você se mexa. “Nosso corpo foi feito para se
movimentar”, ressalta a educadora física Cláudia Forjaz, da Universidade de São
Paulo. O sedentarismo, de certo modo, vai contra a nossa natureza.
O sangue que corre pelas artérias, por exemplo,
depende desse agito para viajar sem entraves. Logo, se permanecemos parados
feito múmia de filme B, aumenta o perigo de um entupimento nessa rede. Não à
toa, em uma pesquisa da Universidade Osaka, no Japão, o hábito elevou em 70% o
risco de embolia pulmonar – condição marcada por um bloqueio nos vasos dos
pulmões. “Apesar de não termos investigado a causa do problema, acreditamos que
seja consequência da redução na velocidade da circulação sanguínea. E isso é
resultado do tempo excessivo que as pessoas passam sentadas”, explica o
epidemiologista Toru Shirakawa. “Fazer uma pausa, levantar e caminhar um pouco
pelos arredores já ajuda a prevenir essas complicações”, aconselha.
Cláudia concorda e ainda ensina uma conta simples
para usar no dia a dia. “Para cada meia hora na cadeira, o ideal é passar cinco
minutos em pé”, diz. Se achar difícil adotar esse esquema imediatamente, ou
estiver em uma semana atribuladíssima no trabalho, saiba que mexer um pouco as
pernas faz diferença. Foi o que concluiu um experimento publicado recentemente
no periódico American Journal of Physiology Heart and Circulatory Physiology.
Depois de analisar a função vascular dos membros inferiores de 11 jovens
saudáveis antes e depois de ficarem três horas na cadeira, os estudiosos concluíram
que movimentar essa região do corpo, ainda que sentado, traz vantagens aos
vasos.
“No entanto, a melhor saída para driblar os efeitos
do comportamento sedentário é apostar na atividade física”, frisa o educador
físico Rodrigo Reis, do Centro de Pesquisa em Prevenção da Universidade
Washington em St. Louis, nos Estados Unidos. “Ela não só reduz a probabilidade
de danos como traz benefícios extras”, complementa. “Nossos resultados sugerem
que a prática diária de 60 a 75 minutos de exercícios elimina o risco de morte
decorrente do excesso de tempo sentado”, reforça Ekelund, do trabalho
norueguês.
Mas vale a pena ler de novo: além de suar a camisa,
é crucial aproveitar o tempo de folga para investir em atividades que não
incluam só ficar prostrado em frente à televisão. É isso que enterra de vez as
chances de levar uma vida mais equilibrada. No lugar, que tal dar início a um
curso de pintura? Ou, ainda, reunir-se mais com a família e os amigos? Também
dá para intercalar um episódio da série do momento com capítulos de um livro –
sempre lembrando de ficar em pé vez ou outra. Atitudes singelas podem tanto
minimizar o drama ao longo do roteiro como ajudar a evitar finais infelizes.
Sentado e doente
Por que a inércia abala o corpo todo
Coluna indefesa
A postura dos sentados, em geral, é curvada, o que
pode danificar os discos que ficam entre as vértebras.
Coração ferrado
Como o sangue não circula direito, os vasos correm
maior risco de entupir e sobrecarregar o músculo cardíaco.
Cabeça de zumbi
Com menos oxigênio trafegando, o cérebro falha na
missão de nos deixar alertas. Cai, portanto, nosso nível de concentração.
Cadê o fôlego?
A má postura deixa os pulmões sem espaço para
expandir. Isso limita a quantidade de oxigênio que será enviada ao sangue.
Peso pesado
O sedentarismo, somado à ingestão de alimentos
calóricos, leva ao acúmulo de gordura no organismo.
Doce veneno
A falta de movimento dificulta a conversão do açúcar
presente na circulação em energia. É um passo para o diabete.
Por que levantar?
Os números confirmam: ficar sentado não é nada bom
13% é quanto sobe o risco de mortalidade por
assistir à TV durante mais de duas horas.
5% é quanto aumenta a probabilidade de morrer a cada
duas horas extras sentado.
4% das mortes no mundo seriam evitadas com três
horas a menos na cadeira ou no sofá.
Fonte: https://saude.abril.com.br/fitness/televisao-vale-a-pena-ver-menos/
- Por Karolina Bergamo - Foto: Dulla