A ingestão acima do ideal impacta diretamente o funcionamento do corpo e o equilíbrio metabólico
O Halloween não é uma tradição brasileira, mas a
comemoração caiu no gosto do público — inclusive entre os adultos. Escritórios
promovem festas temáticas, academias entram no clima e, em casa, é difícil
resistir aos doces que sobram das brincadeiras das crianças. Chocolates, balas
e sobremesas carregadas de caldas e recheios passam a circular com mais
frequência, e o que parece uma diversão inofensiva pode, na verdade, trazer
riscos à saúde.
Uma revisão publicada na revista britânica The
BMJ, chamada "Dietary sugar consumption and health: umbrella review",
mostrou que o consumo excessivo de açúcar está associado a 45 efeitos negativos
no organismo, entre eles obesidade, diabetes, hipertensão, doenças
cardiovasculares, depressão e envelhecimento precoce.
Embora o açúcar tenha um papel cultural e emocional
importante, presente em comemorações, recompensas e até no afeto, a ciência vem
reforçando que o consumo acima do ideal impacta diretamente o funcionamento do
corpo e o equilíbrio metabólico.
Riscos do açúcar para os sistemas do organismo
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a recomendação
é limitar o consumo de "açúcares livres" a menos de 25 gramas por
dia, o equivalente a seis colheres de chá. No entanto, boa parte da população
ultrapassa facilmente essa quantidade já no café da manhã.
O médico Danilo Almeida, pós-graduado em Nutrologia
pela Associação Brasileira de Nutrologia (ABRAN) e em Metabolômica pela
Academia Brasileira de Medicina Funcional Integrativa, explica que o açúcar em
excesso interfere em praticamente todos os sistemas do organismo.
"O corpo humano não foi projetado para lidar com
o volume de açúcar presente na alimentação moderna. Esse consumo contínuo causa
picos de glicose e insulina, aumenta a inflamação, desregula hormônios e
acelera o envelhecimento celular", afirma.
Impacto do açúcar no metabolismo
O açúcar é uma fonte rápida de energia, mas, quando
ingerido em excesso, o que o corpo não usa é transformado em gordura e
armazenado, especialmente na região abdominal. Isso contribui para a
resistência à insulina, quadro em que o organismo perde a capacidade de usar a
glicose de forma eficiente. "Esse é o primeiro passo para o
desenvolvimento de diabetes tipo 2, hipertensão e dislipidemia", explica o
médico.
Além do impacto metabólico, o açúcar também afeta o
cérebro. Seu consumo em excesso estimula a liberação de dopamina,
neurotransmissor associado à sensação de prazer, o que explica o comportamento
compulsivo. "O açúcar ativa os mesmos circuitos cerebrais de recompensa
que algumas drogas. Por isso, quanto mais a pessoa consome, mais sente necessidade
de consumir de novo", destaca Danilo Almeida.
Fontes escondidas de açúcar
O açúcar não está apenas em sobremesas e
refrigerantes. Ele aparece, muitas vezes disfarçado, em alimentos considerados
"salgados" ou "saudáveis". Pães de forma, molhos prontos,
iogurtes, cereais matinais e até produtos light e zero podem conter grandes
quantidades de açúcares adicionados. "O consumidor precisa ler o rótulo.
Ingredientes como xarope de glicose, maltodextrina, dextrose e frutose são
diferentes nomes para o mesmo açúcar", alerta o médico.
Segundo ele, mesmo os sucos de fruta industrializados
e as bebidas à base de plantas podem conter grandes quantidades de açúcares
livres, já que a estrutura da fruta é rompida e a fibra, responsável por
retardar a absorção da glicose, é perdida.
O consumo excessivo de açúcar afeta o organismo de
diversas formas, inclusive impactando o equilíbrio hormonal, a imunidade e a
saúde mental
Consequências silenciosas
A ingestão excessiva de açúcar também pode influenciar
o equilíbrio hormonal, a imunidade e a saúde mental. "O excesso de glicose
circulante aumenta o estresse oxidativo e a inflamação sistêmica. Com o tempo,
isso prejudica a função das mitocôndrias (as 'usinas de energia' das células) e
reduz a capacidade de regeneração do organismo", explica Danilo Almeida.
A longo prazo, esse desequilíbrio contribui para
fadiga constante, dificuldade de concentração, aumento da gordura visceral e
maior risco de doenças crônicas. Em homens, pode até reduzir os níveis de
testosterona; em mulheres, agrava desequilíbrios hormonais ligados à síndrome
dos ovários policísticos (SOP).
Como reduzir o consumo sem abrir mão do sabor
Para equilibrar o paladar, o médico recomenda
substituir os açúcares simples por fontes naturais e alimentos integrais, ricos
em fibras e nutrientes. "As fibras desaceleram a absorção da glicose e
evitam os picos de insulina. Além disso, o consumo de gorduras boas e proteínas
em todas as refeições ajuda a controlar o apetite e reduzir a vontade de comer
doce", orienta.
Boas estratégias incluem:
Trocar refrigerantes e sucos industrializados por água
com limão ou frutas frescas;
Priorizar frutas inteiras em vez de sucos;
Cozinhar e adoçar em casa, usando menos açúcar;
Ler os rótulos e identificar os nomes escondidos do
açúcar;
Evitar sobremesas após todas as refeições,
reservando-as para ocasiões especiais.
Adoçar menos é um hábito treinável
O paladar é adaptável e, com o tempo, o organismo
aprende a apreciar sabores menos intensos. "Depois de algumas semanas
reduzindo o açúcar, o cérebro reconfigura a percepção do doce. Aquilo que antes
parecia 'sem graça' passa a ter sabor suficiente", explica o médico.
Ele lembra ainda que a qualidade do sono e o manejo do
estresse influenciam o desejo por doces. "Pessoas cansadas e ansiosas
tendem a buscar açúcar como compensação emocional. Por isso, cuidar da mente
também é uma forma de cuidar do metabolismo", afirma.
Para Danilo Almeida, não há problema em comer um doce
de vez em quando. "O perigo está na rotina, no açúcar que aparece todos os
dias, em pequenas doses, sem que a gente perceba", finaliza.
https://www.terra.com.br/vida-e-estilo/saude/entenda-o-perigo-do-consumo-excessivo-de-acucar,1ae7b23f5d3d4275e74e32ac7b6bfe7dqco6xpch.html?utm_source=clipboard
- Por Paula de Paula - Foto: Fascinadora | Shutterstock / Portal EdiCase
