50 milhões de brasileiros acima dos 16 anos nunca
foi a um oftalmologista, e muitos desconhecem que a doença pode levar à
cegueira. A única forma de preveni-la é marcar uma consulta
Se você está lendo este texto é porque se interessa
por assuntos de saúde. Pode-se concluir também que, por ter tanto interesse
nesse tema, você seja zeloso no cuidado com a sua incolumidade física e mental.
Isso revela, no mínimo, uma maior atenção da sua parte com a dieta, alguma
disciplina para a prática de atividades físicas e, claro, visitas periódicas ao
médico. Mas e quanto a sua saúde ocular? Se não há necessidade do uso de lentes
corretivas, é muito provável que você esteja equivocado: não precisar de óculos
não justifica o pouco cuidado com uma das funções mais importantes do seu
corpo, a sua visão.
A razão para isso é que a segunda maior causa da cegueira prevenível
não apresenta sintomas. E, quando apresenta, revela que danos significativos já
ocorreram. Estamos falando do glaucoma, um grupo de doenças que acomete o nervo
encarregado de conectar a imagem ao cérebro. Caso não ocorra o diagnóstico
precoce e o devido tratamento, as chances de perder a visão são grandes.
Larga incidência
De acordo com Cristiano Caixeta, médico do
Departamento de Oftalmologia da Santa Casa de São Paulo e diretor da Sociedade
Brasileira de Glaucoma (SBG), sabe-se que um em cada 40 adultos com mais de 40
anos tem glaucoma com algum grau de perda da função visual, e isso
representa 2,5% da população mundial. “Dados estatísticos estimavam que, no ano
de 2010, tivéssemos 60 milhões de pessoas acometidas pela doença em todo o
mundo”, diz o especialista. “No ano de 2020 espera-se que tenhamos 79,6
milhões de portadores da doença, e destes, 11,5 milhões serão cegos dos dois
olhos”, observa.
Caixeta afirma que não há dados precisos no Brasil,
mas as progressões indicam que existem mais de 1 milhão de pessoas com este
diagnóstico. “O grande problema são os indivíduos que ainda não foram
examinados”, acrescenta. Caixeta se dedica ao glaucoma há mais de uma década e
conta que sua inspiração foi um professor da faculdade, Geraldo Vicente de
Almeida, também oftalmologista.
“Optar por essa especialidade foi uma escolha
acertada, pois tenho uma recompensa diária: poder atuar na preservação e na qualidade
visual de meus pacientes”, fala o médico. Embora a redução da incidência
da doença seja uma meta impossível, o diretor da SBG acredita na diminuição do
dano causado por ela. “Quanto mais cedo se identificar o problema, melhores
serão as respostas às estratégias que impedem a sua progressão. Daí
recomendarmos consultas regulares”.
Veja a seguir a entrevista exclusiva que Caixeta
concedeu à VivaSaúde:
O que é exatamente esta doença?
O glaucoma é uma patologia ocular crônica e progressiva
que provoca lesão no nervo óptico e alterações no campo visual. Nas fases
iniciais, a doença é silenciosa, sem sintomas, o que retarda seu diagnóstico.
Na maioria dos casos, sua manifestação é acompanhada do aumento da pressão intraocular. Mas encontramos casos em que não há
essa característica. O portador de glaucoma, se não tratado adequadamente,
começa a perder a visão periférica (lateral). Nos estágios mais
avançados, a visão central também é atingida, podendo levar a uma
irreversível cegueira. Quanto mais cedo a doença for diagnosticada e tratada,
maiores serão as chances de se evitar essa perda. É importante ressaltar que
não existe cura, mas controle da doença.
Se há tipos diferentes, qual deles é o mais comum?
Glaucoma é o primeiro nome dessa patologia e o
oftalmogista é quem lhe dáum sobrenome. São vários os tipos e eles vão desde o
Glaucoma Primário de Ângulo Aberto ou Fechado (variações de como um líquido
próprio do olho é drenado na corrente sanguínea e que influencia na pressão
ocular); o Congênito e o Juvenil. Há variações secundárias: o Glaucoma
pós-trauma, o resultante ao uso de medicamentos (como o corticoide
nas apresentações oral, tópica ou ocular). O mais comum é o Primário de Ângulo
Aberto, que acomete cerca de 3/4 dos portadores da enfermidade no mundo.
Quem se encontra no grupo de risco?
Embora não seja possível explicar por que uma pessoa
desenvolve glaucoma, ele é mais frequente em adultos com mais de 40
anos, na presença de histórico familiar, entre as pessoas afrodescendentes e
portadores de miopia e pressão ocular elevadas, bem como em pacientes que
tiveram trauma ou inflamação oculares, além dos usuários de corticoides.
Como é feito o diagnóstico?
Consultas regulares ao oftalmologista e exames
complementares como o de fundo de olho, medida da pressão intraocular,
gonioscopia (investiga o tipo de glaucoma) e exame de campo visual permitem o
diagnóstico.
Qual é a reação dos pacientes?
Ninguém recebe bem a informação de que é portador de
umadoença crônica, que não tem cura e pode ser transmitida a seus decendentes.
Nesse momento, a relação médico-paciente é fundamental. O oftalmologista deve
ser capaz de mostrar, com segurança, que a pessoa está diante de um doença
grave, que pode trazer limitações, mas é controlável. Ademais disso, é possível
minimizar os danos causados. O paciente precisa ser conscientizado sobre a
importância do seu comprometimento em seguir as orientações médicas. O
apoio da família é fundamental, tanto quanto as visitas regulares ao
oftalmologista. Estes são os principais pilares para o sucesso da terapia. A
família é essencial em um tratamento que deve durar por toda a vida.
O tratamento é tão difícil, assim?
Hoje dispomos de várias classes de medicamentos para
o gerenciamento da doença. O ofalmologista deverá orientar o paciente sobre
quando e como usá-los. Em geral, optamos por tratamentos com colírios, para começar. As cirurgias, incluídas as técnicas
com laser, são reservadas para casos em que não há boa resposta aos remédios,
ou para pacientes que não podem usar colírios. Como disse, o tratamento é para
toda a vida e a adesão é difícil, pois os colírios devem ser usados todos dias,
nos mesmos horários e, às vezes, são associados a outras medicações, que serão
ministradas em diferentes horários do dia. E há ainda os efeitos colaterais,
difíceis de serem tolerados (ardor, vermelhidão ocular e, em alguns
casos, o crescimento dos cílios), já que a doença, em si, é assintomática na
fase inicial.
O que o paciente deve esperar?
O impacto na qualidade de vida é diretamente
proporcional ao grau do prejuízo da visão do paciente. Na fase inicial, o
paciente não encontra limitações. Já nos estágios mais avançados, as pessoas
passam a ter restrições do campo de visão e podem se tornar inseguros na
execução de tarefas simples do cotidiano. Dificuldades para dirigir ou sair de
casa sem acompanhante são comuns. Muitas vezes passam a esbarrar em objetos que
não são vistos, tropeçam e caem com mais facilidade. Isso gera insegurança e
pode levar aestados depressivos.
A visita é anual também para quem já foi
diagnosticado?
Nesses casos, a periodicidade deve ser definida pelo
médico que acompanha o paciente.
Fonte: http://revistavivasaude.uol.com.br/clinica-geral/conheca-os-riscos-dessa-doenca-degenerativa/3214/
- Texto: Cristina Almeida / Foto: Shutterstock / Adaptação: Clara Ribeiro