A estratégia de pular refeições para turbinar os
exercícios físicos está ganhando popularidade. Entenda se isso traz ou não
benefícios à saúde
Esta semana estava na academia e um professor me
perguntou: “Treinar jiu jitsu em jejum ajuda ou atrapalha?”. A pergunta é bem
interessante e merece uma reflexão.
Os estudos mostram que o jejum está associado à
ativação do sistema simpático. Explico: o tal sistema simpático prepara nosso
organismo para fugir ou lutar. Ou seja, se a falta de comida coloca o corpo em
estado de alerta, é razoável imaginar que praticar jiu jitsu de estômago vazio
melhoraria o desempenho, certo?
Pois é, mas na verdade o jejum atrapalha. As lutas
não envolvem apenas força e agressividade, como animais famintos brigando pela
presa. Pelo contrário: ela exige estratégia e racionalidade.
Quando um judoca, carateca ou qualquer outro lutador
entra num embate, ele analisa os movimentos do adversário e se move de acordo
com as fragilidades do oponente. Quando estamos em jejum, comprometemos nossa
racionalidade e agimos instintivamente – nós estimulamos nosso lado bicho e
enfraquecemos o lado racional.
Lembre-se de como você se comporta quando está com
fome (já falamos disso em outro post). Nós perdemos a linha facilmente e
perdemos a capacidade de dialogar. Dentro ou fora de uma luta, não é bom ficar
assim.
Para além das artes marciais
A piora não se resume a esse tipo de prática
esportiva. E um exemplo vem de um artigo científico que publicamos recentemente
como fruto do mestrado do meu orientando Willian das Neves, no Laboratório de
Nutrição da EEFE-USP. Em seu estudo, o Willian mostrou que o exercício em jejum
compromete a capacidade de treinamento e de força.
Nesse caso, o treinamento era intenso e voltado para
o ganho de massa muscular. Resultado: o longo período sem comer abalou a
adaptação do corpo aos estímulos do exercício físico. O jejum, portanto, afeta
a racionalidade… e joga contra a malhação.
E para emagrecer, o jejum ajuda?
Acordar, tomar um banho, vestir-se e ir para o
trabalho sem abrir a geladeira ajuda a emagrece mais? A resposta é, novamente,
não.
Os primeiros estudos sobre o tema indicaram que o
jejum disponibiliza mais gordura para ser queimada. E isso de fato ocorre.
Porém, é como se mil pessoas fossem a sua casa para um churrasco trazendo um
pacote de carne nas mãos (a gordura), mas você só tivesse uma churrasqueirinha
de camping.
Dentro do corpo, essa churrasqueira se chama
mitocôndria. Localizada no interior da célula, ela queima as fontes de energia.
Mas não adianta ter um monte de gordura livre se a as mitocôndrias não as
queimam a tempo. E elas, não importa o tamanho e a quantidade, não tem fôlego
para lidar com a dose extra de gordura que é disponibilizada pelo jejum. Logo,
os pneus seguem na mesma.
Some a isso o fato de que o jejum tira nossa
racionalidade – favorecendo episódios de comilança extrema – e você já percebe
que dificilmente o sofrimento de pular refeições termina em emagrecimento (no
longo prazo, claro). É óbvio que, quando você ingere menos calorias, tende a
perder peso. Mas é possível (e recomendável) fazer isso sem abdicar do café, do
almoço ou do jantar.
Isso é um cardápio equilibrado.
O jejum, presente em diversas doutrinas e religiões,
possui seu apelo como crença, fé etc. Aqui não cabe discussão, apenas respeito.
Agora, se o objetivo é emagrecer, treinar e ficar forte, lembre-se: ele não é
nosso aliado.
Fonte: https://saude.abril.com.br/blog/o-fim-das-dietas/treinar-em-jejum-ajuda-ou-atrapalha/
Por Theo Ruprecht - Foto: Dercilio/SAÚDE é Vital