Nunca foi tão importante proteger os bichos de estimação de
pulgas, ácaros, carrapatos, mosquitos e vermes — e das doenças que eles
espalham
Apesar de todos os avanços nos cuidados com os pets e na
medicina veterinária, uma corja de inimigos — nem sempre vistos a olho nu —
continua azucrinando a saúde dos bichos e levando muitos deles aos consultórios
Brasil afora. Falamos de uma quadrilha de parasitas que abrange de pulgas e
carrapatos a vermes e outros seres microscópicos. Basta um passeio pelo parque
para voltar com um desses ingratos hóspedes.
Pulgas por trás de coceiras e lesões na pele… Verminoses que
comprometem o aproveitamento de nutrientes e a qualidade de vida. E, se não
bastasse, tem até os vilões alados, os mosquitos, que, principalmente no verão,
picam e espalham doenças. Uma das mais ameaçadoras é a leishmaniose, que, até
pouco tempo atrás, diante da inexistência de um tratamento e da crença de que
era transmitida dos cães para os humanos, fez com que milhares de cachorros
fossem sacrificados.
Outros males disseminados por parasitas merecem vigilância.
Caso da esporotricose, causada por um fungo que vive em cascas de madeira e
epidêmica no Brasil, sobretudo no Rio de Janeiro e nas regiões Norte e
Nordeste. As cidades litorâneas e úmidas concentram também mosquitos que, além
da leishmaniose, podem transmitir a dirofilariose, outra moléstia de difícil
controle.
O quadro geral é realmente sério, mas não há motivo para
pânico. A boa notícia é que dá para prevenir e até tratar as encrencas
alastradas pelos parasitas. E é isso que você vai aprender a seguir.
Esporotricose, a doença causada por um fungo da pesada
Atenção, donos de felinos que vivem em áreas tropicais, como
o Rio de Janeiro: os gatos são as principais vítimas de um fungo fatal. O
Sporothrix brasiliensis, principal causador da esporotricose no país e
encontrado em abundância em troncos de árvores e no solo, costuma atacar
especialmente os gatos que gostam de dar passeios ao ar livre. E, ao serem
infectados durante escapadas de casa, eles mesmos se tornam vetores dessa
zoonose para seus tutores.
O principal sintoma são feridas na pele do bicho,
principalmente no focinho, que podem apresentar uma secreção purulenta, além de
queda de pelos, falta de apetite e vômitos.
“É uma micose profunda, que atinge o tecido abaixo da pele e
pode migrar para vasos linfáticos e outros órgãos”, detalha a veterinária
Juliana Trigo, analista técnica da Ourofino, fabricante de medicamentos
veterinários.
A proliferação da esporotricose por aqui tornou o Brasil
líder em números de casos no mundo. A constatação é do Instituto Nacional de
Infectologia Evandro Chagas, ligado à Fiocruz, que diagnosticou cerca de 5 mil
felinos com a doença nos últimos 20 anos.
“É o maior registro de casos clínicos em animais publicado
em periódicos científicos até o momento”, conta o veterinário Sandro Pereira,
chefe do laboratório de pesquisa clínica em dermatozoonoses em animais domésticos
da instituição.
A enfermidade não possui notificação obrigatória em todos os
estados do Brasil — por isso não se sabe a prevalência nacional. No Rio, porém,
os estudos apontam que a micose se tornou um problema de saúde pública, devido
ao aumento dos casos em humanos — de acordo com uma pesquisa recente, 95% dos
episódios da zoonose ocorreram nos 11 municípios da região metropolitana do
estado. “No Nordeste também tem crescido o número de diagnósticos”, alerta
Pereira.
A esporotricose afeta diversos animais, incluindo cães,
cavalos, porcos e até espécies silvestres. Não se sabe por que os gatos são os
mais atingidos — estima-se uma proporção de um cão para 25 felinos.
Provavelmente, explica Pereira, seu sistema imunológico seja ineficiente diante
do comportamento virulento do fungo.
Para protegê-los, os veterinários recomendam a castração
precoce, uma vez que a medida reduz o ímpeto do animal de sair dando voltas por
aí.
O tratamento
A esporotricose tem cura quando diagnosticada precocemente.
O tratamento com antifúngicos, como o itraconazol (acompanhado ou não por
iodeto de potássio) é longo: pode se estender por quatro a seis meses. No
período, o tutor deve tomar cuidado para não ser contaminado ao sofrer
arranhões e realizar a higienização da cama e dos utensílios usados pelo pet.
Nos casos de evolução da moléstia em que não há mais chances
de cura, recomenda-se a eutanásia e a cremação dos corpos.
Pulgas, ácaros e carrapatos, os arqui-inimigos da pele
Sua presença não costuma ser difícil de notar. Por se tratar
de parasitas externos e visíveis, pulgas e carrapatos tendem a ser percebidos
mais cedo pelos tutores. E mesmo os ácaros, embora microscópicos, produzem
reações claras na pele. O fato de serem mais identificáveis, no entanto, não os
torna menos problemáticos.
Além de causarem uma série de chateações por si mesmos,
pulgas, ácaros e carrapatos também podem ser vetores de outros parasitas. As
pulgas tomam conta do corpo do animal tanto a partir do ambiente quanto pelo
contato com outros bichos infestados.
Praga comum no dia a dia e nas clínicas veterinárias,
provocam coceira, irritação e manifestações alérgicas na pele. Em caso de
infestações severas, chegam até a provocar anemia, pois o inseto se alimenta do
sangue dos hospedeiros. A pulga ainda pode carregar um verme perigoso, o
Dipylidium caninum, causador da dipilidiose, uma doença intestinal.
Os carrapatos também se esmeram em encontrar abrigo e comida
na parte externa do organismo. Estão distribuídos em mais de 870 espécies e são
temidos pelos prejuízos que causam à pecuária. O tipo mais comum em animais de
companhia brasileiros é o carrapato marrom, o Rhipicephalus sanguineus. Embora
seja mais frequente em cães, ele também persegue gatos.
A exemplo das pulgas, carrapatos podem levar à anemia, não
só por se alimentar de sangue mas por transmitirem um protozoário que ataca
glóbulos vermelhos e brancos, causando uma doença conhecida como babesiose.
“É importante lembrar que só 5% das larvas estão no corpo do
hospedeiro. O restante está no ambiente ao redor”, observa o veterinário
Gervásio Bechara, professor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná.
“Muita gente, ao tratar seu animal, acaba fazendo uma prevenção errada: esquece
os 95% que estão na casinha, na grama, no cimentado”, alerta. Por isso,
precisamos estar atentos aos ninhos do bichinho, que pode se abrigar nas
paredes e em locais mais altos, próximos ao teto.
Ácaros, assim como os carrapatos, são aracnídeos, só que
invisíveis a olho nu. Sua presença está relacionada aos diferentes tipos de
sarna, como a demodécica, a otodécica e a sarcóptica, as mais comuns nos pets.
A principal vilã é a sarna sarcóptica, que, além de
altamente contagiosa, pode ser transmitida ao tutor. Diante dela, a pele fica
vermelha e com coceira intensa, levando à abertura de feridas e à queda de
pelos.
A sarna demodécica não costuma causar coceira nem é
transmissível a humanos. Já a otodécica causa forte coceira nas orelhas e vem
acompanhada por uma secreção escura — uma forma de identificá-la em seu cão ou
gato é se eles estão chacoalhando a cabeça com frequência, uma tentativa de
aliviar o incômodo. A despeito do tipo, convém visitar o veterinário.
Proteção tripla
Os últimos produtos lançados pela indústria de saúde animal
prometem proteção conjunta contra ácaros, carrapatos e pulgas. “São sprays e
coleiras à base de acaricidas químicos”, explica o veterinário Gervásio
Bechara.
Elas liberam as substâncias no pelo do animal conforme eles
se movimentam. Mas, segundo o professor, mesmo esses métodos não são
infalíveis. “Parasitas, especialmente os carrapatos, desenvolvem resistência
aos produtos”, diz.
Assim, também vale a pena prezar a higiene nos locais onde o
pet passa a maior parte do tempo, evitando a proliferação desses hóspedes
indesejados.
Um verme para (não) chamar de seu
Geralmente, a cena é a mesma: o cão, ou o gato, sai para
passear e, de repente, encontra fezes velhas alheias. Como quem não quer nada,
se aproxima, cheira, sente o gosto e segue explorando o ambiente. Ou talvez nem
chegue perto do cocô, mas a grama onde pisa já foi contaminada pelo excremento
de outros animais. Nos dias seguintes, lá vêm diarreia, dores e outros sintomas
digestivos. Assim funciona o modus operandi das verminoses, um grupo de doenças
causadas por parasitas de diversas origens, tamanhos e formatos.
O principal meliante da lista é o Dipylidium, que começa a
jornada parasitária usando a pulga como hospedeira intermediária. É por meio da
ingestão acidental da pulga que cães e gatos liberam a entrada desse
platelminto no seu trato gastrointestinal. Dentro do corpo, o verme achatado
pode chegar a 50 cm de comprimento. Os sintomas são diarreia e coceira na
região anal, que fazem o animal arrastar o ânus pelo chão.
Para o tratamento da parasitose, o indicado é administrar
vermífugos e antipulgas em conjunto. “Dessa forma, evitamos que o ciclo do
parasita se complete”, explica a veterinária Cristine Fischer, professora da
Universidade Luterana do Brasil, em Canoas, no Rio Grande do Sul.
Os cuidadores também devem dedetizar os locais de descanso
dos pets para eliminar as pulgas em estágios menos avançados. Para toda fase da
vida dos bichos de estimação, parece que a natureza tem uma verminose feita sob
medida.
Os nematódeos do gênero Toxocara, por exemplo, são
frequentes em filhotes caninos e felinos de até 1 ano e encabeçam a segunda
posição do ranking. Não raro, os bichos acabam infectados por meio da placenta
e do leite materno. Cada verme cilíndrico desses pode chegar a 18 cm de comprimento
e permanecer no intestino delgado por vários meses.
A toxocaríase provoca atrasos de crescimento, diarreia,
barriga inchada e até morte por obstrução ou perfuração intestinal.
O Ancylostoma é outro nematódeo bem recorrente, mas em
animais adultos. Esse verme se alimenta de sangue no intestino dos cães e, por
isso, provoca diarreia e anemia. As fezes expostas de bichos acometidos podem
desenvolver larvas em menos de 48 horas, se houver temperatura morna e alta
umidade do ar.
A doença pode ser transmitida apenas pelo contato das patas
do animal com o local contaminado. A ancilostomose — ou amarelão — também afeta
os humanos.
O verme mais comum em bichos idosos é o Trichuris, que se
instala no intestino grosso. Uma forma de identificar seu rastro característico
são os pelos feios e quebradiços das vítimas. Os ovos desses nematódeos podem
sobreviver em meio à sujeira externa por mais de quatro anos. Manter quintais
limpos ajuda a evitar sua proliferação.
Como se defender?
A prevenção é simples, mas pede disciplina: recolha a
sujeira deixada pelo seu bicho sempre. Seja no quintal de casa, seja na rua, o
cocô exposto é a principal forma de espalhar vermes. Fazer sua parte evita,
também, que outros animais sejam atacados.
Caso haja alguma suspeita, o veterinário deve fazer uma
avaliação e pedir um exame de fezes.
Mosquitos e perigos no ar
É quando o tempo esquenta que esses insetos voadores fazem a
festa. Assim como nos perturbam, trazem problemas para os animais. O mosquito
Aedes aegypti, que espalha a dengue entre os humanos, transmite aos cães uma
doença grave que afeta o coração, a dirofilariose.
“Se não for tratada, há risco de morte por insuficiência
cardiorrespiratória”, alerta o veterinário Ricardo Cabral, da Virbac,
farmacêutica especializada em saúde animal.
Os mosquitos anófele e cúlex também podem carregar as larvas
da lombriga Dirofilaria immitis, conhecida como “verme do coração”.
Após a picada, as larvas se deslocam pelo sangue até o
músculo cardíaco, e o cão começa a ficar ofegante — daí ele perde o pique e
fica apático. À medida que a moléstia avança, despontam tosse, perda de peso e
convulsões. Comum em regiões litorâneas e úmidas do país, a dirofilariose
precisa ser tratada na fase inicial para evitar o colapso do coração.
Os animais que vivem em regiões mais próximas do mar e em
algumas áreas rurais também estão mais suscetíveis a outro inimigo alado, o
mosquito-palha. Esse inseto pequeno e amarelado — a bem da verdade, não é um
mosquito, mas um flebotomíneo — é o vetor do protozoário causador da
leishmaniose. De acordo com a Fiocruz, o Brasil é o país que mais concentra
espécies de mosquitos-palha no mundo.
Endêmica no país, a doença vem migrando para as cidades com
o avanço da urbanização e do desmatamento. “Após o animal ser picado, o
protozoário se aloja no interior das células, especialmente nas responsáveis
pelo sistema imunológico”, explica Cabral. Felizmente, há uma vacina, aplicada
a cada ano e destinada apenas a animais não infectados: havendo contágio, ela
impede que a doença se desenvolva.
Um dos grandes desafios hoje é detectar o problema cedo. Os
primeiros sintomas são lesões na pele que se confundem com dermatites. Depois
vêm vômitos, diarreias e sangramento nas fezes, também comuns a outras
infecções. Na dúvida, é preciso procurar o veterinário e lançar mão de exames
que flagram o dito-cujo. Quanto antes começar o tratamento, melhor.
Há apenas um remédio contra a doença disponível no Brasil.
Além de controlar as manifestações do problema, a medicação evita a corrente de
transmissão. A barreira, por ora, é o preço: o menor frasco, de 30 mililitros,
custa em média 500 reais.
Até 2016, por causa da carência de um tratamento, os animais
infectados eram todos sacrificados. O abate, alegava-se, era uma forma de
reduzir a disseminação da leishmaniose nos seres humanos — os cães, porém, não
passam a doença aos tutores, são apenas hospedeiros do protozoário.
Graças à ciência e à conscientização, as vítimas do
mosquito-palha ganharam uma nova chance de viver — e ao lado da família.
A salvo dos mosquitos
Use repelentes em coleiras ou sprays vendidos em pet shops.
Telas nas janelas da casa evitam a entrada dos intrusos.
Fique alerta durante passeios em regiões úmidas e quentes.
Mantenha quintal, jardins e arredores limpos o ano todo.
Fonte: https://saude.abril.com.br/vida-animal/como-proteger-seu-bichinho-das-doencas-causadas-por-parasitas/
- Por Juan Ortiz, Maurício Brum, Sílvia Lisboa e Stéfani Fontanive -
Ilustração: Ana Cossermelli/SAÚDE é Vital
Nenhum comentário:
Postar um comentário