A vitamina C desponta como protagonista na prevenção
à catarata. Mas suas colegas de classe também têm truques para proteger os
olhos
Desde a época das grandes navegações até hoje, a
vitamina C coleciona feitos. No passado, livrou milhares de marinheiros do
fatal escorbuto e, hoje, já se sabe que o micronutriente tem participação
especial na produção de colágeno e no fortalecimento da imunidade frente a
tumores e infecções – quem nunca pegou uma gripe e ouviu a recomendação
“vitamina C e cama”?
Grande parte das vantagens vem do seu poderoso
efeito antioxidante. É que o nutriente mais célebre das frutas cítricas combate
os radicais livres, aquelas moléculas que, em excesso, danificam as células do
corpo. Com uma propriedade dessas, fica fácil entender por que o currículo da
substância vive crescendo. Seu último emprego, recém-divulgado por estudiosos
do King’s College London, na Inglaterra, é atuar em defesa dos olhos.
O grupo de pesquisa acompanhou 324 pares de gêmeas
com idades entre 50 e 83 anos por uma década. Durante esse tempo, a velocidade
de progressão da catarata foi medida por meio de fotos do cristalino, a lente
natural do olho – na doença, ela fica turva e a visão embaça. Além disso, as
voluntárias preencheram um questionário alimentar, no qual constava a ingestão
de nutrientes. O cruzamento de dados revelou que, entre as mulheres com maior
consumo de ácido ascórbico, o nome oficial da vitamina C, houve redução de 33%
no ritmo de evolução da catarata. “Sua ação antioxidante auxiliaria a manter a
transparência do cristalino”, traduz o oftalmologista Jae Lee Min, do Hospital
Alemão Oswaldo Cruz, em São Paulo.
A experiência ainda sugere que a ingestão da maioria
das vitaminas e dos minerais contribuiu para a catarata nem aparecer. Mas dois
nutrientes ganharam o troféu nesse quesito: o manganês, dos vegetais
verde-escuros e grãos integrais, e (de novo!) a vitamina C. Sozinha, ela
reduziu em 19% a probabilidade de a visão nublar. “Uma alimentação pobre em
antioxidantes propicia o envelhecimento geral do corpo e também do cristalino”,
raciocina a oftalmologista Keila Monteiro de Carvalho, da Universidade Estadual
de Campinas (Unicamp).
O estudo britânico não é o único a dar motivos para
colorir o menu com laranja, mexerica, limão, acerola e companhia. Publicada
neste ano, uma revisão de 30 trabalhos científicos também concluiu que a
catarata está mesmo na mira da vitamina C. O artigo assinala que seu consumo
fez cair em 17% a probabilidade de uma pessoa encarar o problema. “A ingestão
do nutriente deve ser indicada para a prevenção primária da doença”,
ressaltaram os autores.
Quanto ingerir de vitamina C
Mas, afinal, o que seria um consumo adequado da
substância? “Para os homens, recomendamos 90 miligramas ao dia. E, para as
mulheres, 75 miligramas”, informa a nutricionista Cristiane Cominetti, do Grupo
de Pesquisa em Genômica Nutricional da Universidade Federal de Goiás (UFG).
Para ter ideia, uma laranja concentra cerca de 40 miligramas de vitamina C. Já
100 gramas de pimentão amarelo ostentam nada menos que 200 miligramas do
micronutriente.
Agora, há uma estratégia para aproveitá-lo ao
máximo: tem que priorizar o alimento in natura. Se decidir cozinhar, a saída é
utilizar a água do cozimento em outras receitas, como sopas ou carnes.
“Vitaminas hidrossolúveis, como a vitamina C, podem se perder no caldo da
cocção”, justifica a nutricionista Carla de Morais, pesquisadora da UFG. Quanto
aos sucos, ela conta que também tem artimanha: “Beba logo após o preparo porque
a vitamina C é sensível a variações de temperatura”.
Outras vitaminas em prol dos olhos
Já faz um tempinho que a ciência reconhece o papel
da alimentação, com destaque para as vitaminas, na saúde ocular. Publicado em
2001, o clássico Estudo sobre Doenças do Olho Relacionadas à Idade, conhecido
pela sigla em inglês AREDS, foi o primeiro a identificar que uma combinação de
antioxidantes era capaz de baixar em 25% o risco do avanço da degeneração
macular relacionada à idade, ou DMRI.
Investigadores de várias partes do mundo envolvidos
na pesquisa chegaram até a bolar um suplemento em cima disso – ele inclui
zinco, cobre, ômega-3 e carotenoides, como luteína e zeaxantina, além das
vitaminas C e E. A última, só para dizer, está nos peixes, no ovo e nas
oleaginosas.
“Hoje, a fórmula vitamínica do AREDS é recomendada a
pessoas com degeneração em graus intermediário ou avançado”, conta o
oftalmologista Daniel Lavinsky, do Hospital de Clínicas de Porto Alegre.
Segundo ele, a suplementação foi a única alternativa para suprir as altas doses
de nutrientes necessárias para deter a progressão da doença, que, assim como a
catarata, pode levar à cegueira.
Mas, como forma de prevenção, mais uma vez, melhor
caprichar no prato. “Uma dieta rica em nutrientes ajuda a limpar os dejetos do
metabolismo que causam a morte das células do fundo do olho”, esclarece
Lavinsky.
Repor a vitamina D em caso de ausência dessa
substância – embora esteja nos peixes e nos lácteos, a principal fonte são os
raios solares – também teria efeito benéfico. Um estudo coreano que examinou
dados médicos de mais de 17 mil adultos concluiu que baixos índices da vitamina
no organismo deixa o sujeito mais predisposto à vermelhidão e à coceira nos
olhos características da doença.
Porém, ainda não há consenso em relação à
suplementação nesse cenário. “São necessários mais estudos para saber a dose
exata a ser prescrita”, relata Min.
Enquanto isso, outra indispensável no cardápio é a
vitamina A, encontrada no bife de fígado, no leite, na gema de ovo, na cenoura,
na abóbora e no espinafre. Estima-se que cerca de 17,4% das crianças e 12,3%
das mulheres nas cinco regiões do Brasil tenham déficit da substância.
A questão é que esse descuido tem pelo menos duas
consequências: o olho seco (nesse contexto, a complicação, chamada também de
xeroftalmia, é causada pela falta do micronutriente) e a cegueira noturna,
caracterizada pela dificuldade de enxergar à noite ou na penumbra.
Compreensível: dentro do corpo, a vitamina A ativa a produção da rodopsina, uma
proteína dos bastonetes, as células do olho que nos ajudam a diferenciar o
claro do escuro e a ter visão periférica.
Não à toa, dietas muito restritivas ou repletas de
junk food – que fazem a tal vitamina sumir do organismo – estão associadas ao
mal. “Quando a cegueira noturna é detectada, é necessário fazer a reposição do
nutriente via suplementação para reverter o quadro. Depois, você assegura os
níveis com a alimentação”, ensina a nutricionista Jacqueline Faustino,
pesquisadora da Universidade de São Paulo, em Ribeirão Preto. Pois é: um menu
variado e multicolorido não faz bem só para o paladar, mas também para os
olhos. Em todos os sentidos.
Problemas oculares comuns e influenciados pelo
cardápio
Catarata: ocorre quando a lente do olho, o
cristalino, começa a ficar opaca. A visão se torna embaçada e desbotada. Pode
levar à cegueira.
Degeneração macular relacionada à idade: doença
degenerativa da retina que provoca uma perda progressiva da visão. O indivíduo
enxerga linhas tortas e pontos escuros.
Síndrome do olho seco: provocada por alterações na
composição e na produção da lágrima, resulta em secura, vermelhidão, coceira, ardência
etc.
Cegueira noturna: o portador tem dificuldade de
enxergar à noite ou na penumbra. A deficiência de vitamina A está ligada ao
surgimento da condição.
Outros compostos benéficos para a visão
Ômega-3: presente nos peixes gordurosos, como salmão,
sardinha e atum, ajuda a lubrificar os olhos e mantém a integridade das células
da retina.
Ômega-6: é detectado nos óleos vegetais, nos ovos e
em sementes. Tem um papel semelhante ao do ômega-3 no combate e na prevenção à
síndrome do olho seco.
Luteína e zeaxantina: da família dos carotenoides,
estão na alface, no brócolis, na rúcula, na gema de ovo e no milho. Atuam como
antioxidantes na retina e nas lentes oculares.
Zinco: itens ricos no mineral, como carne, frutos do
mar, leguminosas, oleaginosas e pescados, auxiliam a vitamina A a fazer
melanina, que afasta a cegueira noturna.
Cobre: está nos cereais integrais, nas frutas secas,
nas nozes, nas ostras e nos mariscos. Sua função é evitar a morte de células no
fundo do olho e a degeneração macular.