Há uma alta taxa de lesões entre quem sai dando
passadas por aí. Mas dá pra baixar muito esse risco. Até porque o perigoso
mesmo é ficar parado
A cada toque do pé com o chão, o corpo de um
corredor recebe um impacto que varia de duas a quase cinco vezes o peso dele.
Agora considere que, em uma única semana, ele dá milhares de passos acelerados
durante seus treinamentos. É desgaste do joelho na certa… Só que não. “Correr
de forma recreativa na verdade protege essa e outras articulações. O que faz
mal para elas é o sedentarismo“, garante o ortopedista Eduard Alentorn-Geli, da
Federação Espanhola de Futebol.
Apesar de vinculado a uma instituição focada na
nossa paixão nacional, esse médico liderou um levantamento sobre o suposto elo
entre a corrida e a artrose – chamada de osteoartrite pelos especialistas. Ele
e seus colegas revisaram 17 estudos, que totalizaram dados de 114 829
indivíduos. Entre esse pessoal, alguns apertavam o passo por diversão, outros
eram profissionais (ou quase) e ainda havia aqueles que gostavam mesmo é de pôr
as pernas pro alto. Saiba mais: Correr não causa artrose nos joelhos e no
quadril
Pois vamos ao que interessa: enquanto 10,2% dos
amantes do sofá reclamaram de dores nos joelhos ou quadris ao longo dos anos,
somente 3,5% dos corredores amadores manifestaram o problema. Contudo, o pior
resultado foi o dos atletas. Não menos do que 13,3% ficaram com as juntas
rangendo. “O recado é permanecer ativo sem se exceder”, conclui Alentorn-Geli.
Antes de falarmos em limites, cabe reconhecer os
préstimos da corrida. “Ela promove adaptações positivas na cartilagem, nos
ligamentos, nos tendões e nos ossos”, afirma a educadora física Carina Helena
Wasem Fraga, professora de biomecânica da Universidade Federal do Maranhão. “É
como se essas estruturas precisassem de movimento para se manter saudáveis”,
traduz.
Dar umas voltas no quarteirão também fortalece os
músculos dos membros inferiores, nossos amortecedores naturais. “Se um tênis
esportivo absorve 3% do impacto de uma passada, o quadríceps, um músculo da
coxa, segura 66%”, compara Carina. E, claro, suar a camisa queima calorias, o
que afasta a obesidade, uma das principais causas da artrose. Mas então por que
vemos tantos corredores arrebentados mundo afora?
Não vamos tapar o sol com a peneira. Estatísticas
dão conta de que dois terços dos corredores se contundem em um ano. “Mas, se
esse esporte é benéfico para várias estruturas do corpo, o que explica o
paradoxo?”, questiona Carina. Ela mesma responde: “A completa falta de
planejamento. Boa parte dos praticantes nem sequer pensa sobre frequência,
intensidade e evolução dos treinos”.
De um jeito simplista, tem muito amador correndo que
nem profissional. E, quando você queima a largada, seu organismo vai protestar
– não importa a modalidade. “Os movimentos da corrida não são especialmente
danosos, ao contrário do que se imagina. As lesões costumam vir de uma
sobrecarga inadequada”, reforça o ortopedista Moisés Cohen, diretor do Instituto
Cohen de Ortopedia, Reabilitação e Medicina do Esporte, em São Paulo. “É a
pessoa que quer emagrecer para o verão ou se preparar para uma maratona da
noite para o dia”, exemplifica.
Na maioria dos casos, portanto, não estamos falando
de males irreversíveis e que aparecem após décadas de abuso, como a artrose.
São as tendinites, os estiramentos musculares, os desgastes iniciais na
cartilagem… Enfim, chateações contornáveis com um mínimo de cuidado.
Como já dissemos, o primeiro passo é começar com
calma, manter a regularidade e não pular etapas. Se possível, trace seus
treinamentos com um profissional de educação física para que ele ajuste a dose
de esforço segundo suas características e metas. “Sugiro ainda complementar a
modalidade com exercícios de força, principalmente para fortalecer as pernas e
os quadris”, propõe Carina.
Outra coisa: valorize o repouso. “O descanso é o
treino silencioso. Nesse período, o corpo repara seus tecidos e se adapta às
demandas da atividade física”, destaca Tony Meireles, profissional de educação
física da Universidade Federal de Pernambuco. E, quanto mais suor, mais sossego
será necessário depois. Que fique claro, não se trata de proibir o indivíduo de
correr uma maratona, até porque esses eventos motivam determinadas pessoas.
“Basta entender que provas assim cansam demais e não devem ser feitas a todo
momento, nem por praticantes condicionados”, arremata Meireles.
E como fica o coração?
Por mais que os exercícios físicos sejam aliados
sacramentados do peito, o medo de sofrer um piripaque durante a corrida
aterroriza muitos brasileiros. E lá vamos nós de novo prezar pela sinceridade:
o Colégio Americano de Medicina do Esporte atesta que sujeitos ativos têm um
risco duas vezes maior de infartar durante um treino intenso. Mas… a
probabilidade de esse chabu grave acontecer em qualquer hora do dia é 50 vezes
menor em comparação com os sedentários. Cinquenta vezes!
Entretanto, aqui também devemos discutir a
quantidade e a intensidade das passadas. Em uma clássica pesquisa inglesa com 5
159 homens entre 40 e 59 anos que foram acompanhados por quase duas décadas,
primeiro constatou-se o óbvio: os inativos possuíam o maior risco de sofrer uma
pane cardíaca. Acontece que os mais resguardados contra essa encrenca eram os
participantes que adotaram um ritmo moderado – quem apertou demais o passo até
viu os benefícios se esvaírem um pouco.
“A corrida reduz a pressão, baixa o colesterol,
controla a glicemia… São inúmeras vantagens para o sistema cardiovascular”, diz
o médico Iran Castro, um dos autores da Diretriz de Cardiologia do Esporte e do
Exercício da Sociedade Brasileira de Cardiologia. “Só é bom evitar extremos e
consultar um médico para ver se há alguma condição que exija cuidados
especiais”, pondera. Atenção: cuidados especiais não significam proibição, até
porque, hoje em dia, a sala de ginástica integra o tratamento de várias
doenças. Portador ou não de um problema de saúde, tenha certeza de uma coisa:
seu sofá é bem menos confortável para o corpo do que parece.
Eu me machuquei. E agora?
“Uma lesão, mesmo se não tão grave, faz certas
pessoas largarem o esporte. Daí porque é crucial preveni-la”, constata o
educador físico Tony Meireles. Ainda assim, nunca dá para se blindar 100%. Se
passar por um infortúnio, respeite o tempo de reabilitação e volte a malhar aos
poucos – por mais que queira, no começo você não vai ter o condicionamento de
antes.
Sinais amarelos
Se eles surgirem, pare e busque apoio médico
Dor súbita e persistente
Limitação de movimento
Cansaço desproporcional
Tontura ou desmaio
Dor no peito
Palpitação cardíaca
Extrema falta de ar
O coração pede agito
Estudo mostra, em homens acima dos 40 anos, o efeito
protetor do esforço físico
Fonte: https://saude.abril.com.br/fitness/e-seguro-e-recomendavel-correr/
- Por Theo Ruprecht - Foto: Vasakna/iStock - Infográfico: Ana Cossermelli/SAÚDE
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