Uma série de problemas — alguns deles graves e nem sempre
ligados ao aparelho respiratório — é capaz de sabotar o fôlego nosso de cada
dia. Saiba em que situações é preciso ficar esperto
Oxigênio é uma daquelas coisas às quais a
gente só dá valor quando sente falta. E, embora isso possa ocorrer ao subirmos
alguns lances de escada ou praticarmos esporte, convém ter em mente, sobretudo
com a chegada do inverno, que uma porção de doenças atinge direta ou
indiretamente a capacidade de respirar. É propício fazer esse aviso quando a
temperatura cai por diversas razões, que afetam tanto pessoas saudáveis como
quem já tem um distúrbio no sistema respiratório, caso de asma, rinite ou
bronquite. "No frio, costumamos ficar mais em ambientes fechados, que
favorecem a contaminação por micróbios, e o ar gelado e seco agride as vias
aéreas, facilitando a ação de bactérias e vírus", explica o médico Jairo
Araújo, presidente da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT).
Não é à toa que, antes de a estação dos termômetros baixos
começar, são realizadas campanhas de vacinação contra gripe e pneumonia, bem
como alertas para o controle da asma. No Brasil, a infecção pelo vírus
influenza H1N1, por exemplo, esteve por trás de 2 614 internações no ano
passado, sendo que 351 casos terminaram em morte. O cenário para os asmáticos, então, é de
perder o fôlego. Com base em levantamentos dos últimos anos, a SBPT estima que
a asma mate seis pessoas por dia no país. "Isso reflete o fato de que mais
de 90% dos indivíduos com o problema não seguem rigorosamente as orientações do
médico", justifica Araújo. Como as crises são mais frequentes em período
de frio e ar seco, esse é o momento para não hesitar em adotar o tratamento a
fim de prevenir falta de ar e outras complicações.
Apesar de entrarmos na temporada mais perigosa para o
aparelho respiratório, é nosso dever informar que o sufoco para obter oxigênio
pode estar relacionado a falhas em outros cantos. "Diagnosticar a origem
da falta de ar deve ser uma preocupação constante nos hospitais, até porque
alguns casos refletem doenças graves. Embora as causas mais comuns sejam
problemas pulmonares, ela pode ser sintoma de males cardíacos e refluxo",
diz o cardiologista João Fernando Ferreira, da Sociedade de Cardiologia do
Estado de São Paulo, a Socesp. É claro que, se você é sedentário e quer apostar
uma corrida, vai sofrer as consequências ao peito. Mas, se o fôlego for
desaparecendo sem motivo, é preciso correr, só que para o médico. Rastreamos, a
seguir, 12 problemas que, em comum, acarretam boicotes ao entra e sai de ar.
Infecções respiratórias
Quando a gripe nos pega, a falta de ar pode aparecer junto a outros sintomas
nada agradáveis: febre, tosse, secreção nasal, cansaço, dor de cabeça... O
vírus influenza invade o corpo e se instala nas vias aéreas, provocando uma
reação inflamatória. O aumento de muco na região e a diminuição do calibre de
brônquios e bronquíolos — tubos que levam o ar para as profundezas dos pulmões
— respondem pela baixa no fôlego. "Por isso, ao primeiro sinal da gripe,
procure atendimento médico", aconselha o pneumologista André Albuquerque,
do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. Para preveni-la, recomenda-se tomar a
vacina e lavar as mãos constantemente. Se a gripe é mal tratada, assim como
outras infecções respiratórias, podem se abrir as portas à pneumonia,
geralmente deflagrada por bactérias que chegam aos pulmões. Ela é uma das
principais causas de internação no país e, muitas vezes, difícil de ser
controlada. Diante de falta de ar e incômodos no peito, o pronto-socorro é
bem-vindo.
Bronquite crônica
A inflamação dos brônquios costuma ser causada por reações alérgicas a poeira,
ácaros ou fungos. Ao entrarem em contato com eles, as estruturas pulmonares
ficam mais contraídas e emperram o trânsito de oxigênio. Além disso, há um
aumento na secreção de muco, que pode entupir a passagem de ar pelos brônquios.
Bronquites tendem a acompanhar o indivíduo ao longo da vida e as crises são
mais frequentes na infância e na adolescência. Além da falta de ar, geram
tosse, expectoração, dor e chiado no peito. "Em tempos de frio e baixa
umidade, é importante hidratar as vias respiratórias com inalação e soro
fisiológico", sugere Albuquerque. Para os períodos críticos, os especialistas
receitam anti-inflamatórios, broncodilatadores e, caso bactérias se aproveitem
da confusão nos pulmões, antibióticos.
Asma
Segundo cálculos da SBPT, cerca de 20 milhões de brasileiros teriam o problema,
também marcado por inflamação nos brônquios e presença de muco ali. O chiado no
peito, um de seus sinais, significa que o ar está percorrendo um tubo estreito
demais. Se esse caminho se fecha, vem a falta de ar. "Temperaturas
baixas, clima seco, infecções e contato com ácaro e pelos de animais são
os gatilhos das crises", alerta a pneumologista Marcia Pizzichini,
coordenadora da Comissão de Asma da SBPT. O segredo para o fôlego não deixar o
asmático na mão nem impor hospitalizações — foram 174 500 no Brasil em 2011 — é
seguir à risca o tratamento, que prevê anti-inflamatórios inaláveis
diariamente. "São remédios seguros e que permitem ao indivíduo ter uma
vida normal", garante Marcia.
DPOC
A doença pulmonar obstrutiva crônica reúne duas encrencas derivadas da inalação
de fumaça: a já citada bronquite e o enfisema pulmonar, que é a morte dos
alvéolos, encarregados das trocas gasosas. "Noventa por cento dos casos
estão associados ao tabagismo, sendo que, em média, demoram 20 anos para o
problema aparecer", diz o pneumologista Oliver Nascimento, vice-presidente
da Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia. A grande questão que cerca a
DPOC é o fato de o fumante pensar que tosse, pigarro e falta de ar são aspectos
inerentes ao vício. Quanto mais tarde é feito o diagnóstico, menor a chance de
minimizar a situação — já que não dá para reverter totalmente os estragos.
"O principal tratamento é parar de fumar, seguido de condutas como
vacinação e atividades físicas. Também entramos com medicamentos que dilatam os
brônquios", explica Nascimento. Prevenir a DPOC não tem mistério: fuja do
cigarro, inclusive se for só nos finais de semana, e dos fumantes.
Câncer de pulmão
Eis outro mal estreitamente ligado ao tabaco — oito em cada dez pessoas com a
doença fumaram ou tinham contato assíduo com a fumaceira. "Ele é o
terceiro tipo mais comum de câncer e um dos mais agressivos, daí sua alta
mortalidade", diz o oncologista Jefferson Luiz Gross, diretor do Núcleo de
Pulmão e Tórax do A.C. Camargo Cancer Center, em São Paulo. Ainda
se suspeita que outros agentes, como poluentes, elevem seu risco. Não é fácil
diagnosticá-lo precocemente porque seus indícios, caso da tosse e da falta de
ar, são encarados como manifestações comuns ao ato de fumar. Assim, o indivíduo
só procura ajuda quando vive sem fôlego ou expele sangue nas tossidas. "De
uns anos pra cá, estudos sugerem a realização anual de tomografias do tórax a
toda pessoa acima de 50 anos que fuma ou já fumou", conta Gross. É um
jeito de identificar cedo o tumor para derrotá-lo.
Hipertensão pulmonar
Essa é uma doença rara, que compromete muito a qualidade e a expectativa de
vida. Ela nada tem a ver com a pressão alta sistêmica. Aqui, o aperto acontece
só nos vasos pulmonares. Problemas cardíacos, respiratórios e infecções podem
estar por trás dele, e uma de suas principais versões, a hipertensão arterial
pulmonar (HAP), não costuma ter causa definida. "O aumento da pressão nas
artérias dos pulmões sobrecarrega o coração. Com o tempo, o órgão se cansa e o
paciente pode desenvolver insuficiência cardíaca", explica o pneumologista
Daniel Waetge, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Por isso que o
ecocardiograma é uma das formas de rastrear a doença. A HAP rende falta de ar,
cansaço, palpitações, inchaços nos pés ou na barriga e até lábios roxos. Bem
limitante, se o tratamento demora, pode cobrar uma vida curta ligada a um
aparelho de oxigênio. "A terapia dispõe de algumas classes de remédios,
mas ainda não temos todas elas no Brasil", diz Waetge.
Rinite
Se você nunca passou por isso, acredite: uma das piores sensações do mundo é
não conseguir respirar e dormir por causa de um nariz entupido. A famigerada
rinite é bem mais popular entre indivíduos alérgicos, mas pode pintar também em
função de gripes e resfriados. Além de tampar as narinas, costuma desatar
coriza e coceira na região — daí a imagem do nariz todo vermelho. "Ocorre
uma inflamação no tecido que reveste lá dentro, acompanhada de um aumento no
volume de sangue, o que dificulta ou corta a passagem do ar", explica o
otorrinolaringologista Reginaldo Fujita, da Universidade Federal de São Paulo.
Para escapar dela, lave o nariz com soro fisiológico diariamente e tome cuidado
com mudanças bruscas de temperatura. "E nunca use sem orientação médica
soluções nasais com vasoconstritores, porque elas podem provocar aumento da
pressão e arritmia", avisa Fujita.
Transtornos psiquiátricos
Desordens como síndrome do pânico, ansiedade e claustrofobia costumam travar a
entrada e a saída de ar do organismo. "Isso está relacionado a uma reação
de defesa natural. Uma descarga de neurotransmissores faz o coração bombear
mais sangue, preparando o corpo para as duas decisões cabíveis num momento de
perigo: fugir ou lutar", diz o psiquiatra Sérgio Tamai, da Associação
Brasileira de Psiquiatria. A consciência de uma situação ameaçadora estimula
algumas regiões do cérebro, como a amígdala, que faz as escolhas, e o sistema
nervoso autônomo, responsável por ações automáticas, como a respiração. Por
isso, além de propiciar falta de ar, é comum que haja o aumento da pressão arterial,
taquicardia e excesso de transpiração, assim como vontade de urinar ou evacuar.
"Em alguns quadros psiquiátricos, a amígdala está descalibrada e pequenos
estímulos já são capazes de gerar reações mais intensas", conta Tamai.
Para controlar tais distúrbios, que costumam impactar no comportamento, os
médicos prescrevem antidepressivos e ansiolíticos, além de sugerir psicoterapia
e até mesmo meditação.
Panes no coração
A insuficiência cardíaca é a segunda causa mais comum de falta de ar — só fica
atrás dos problemas respiratórios em
si. Ela se caracteriza pela incapacidade de o órgão bombear
sangue para o resto do corpo. Com o tempo, o músculo cardíaco fica flácido e
uma parte do líquido vermelho acaba represada lá nos pulmões. "Os
brônquios e bronquíolos ficam úmidos e isso dificulta a troca de gases, o que
leva a uma dificuldade de difundir oxigênio no sangue e retirar gás
carbônico", explica o cardiologista João Fernando Ferreira, da Socesp.
Como os problemas no coração são os maiores causadores de mortes no mundo todo,
o conselho é fazer o checkup anual e ficar atento a manifestações que podem
aparecer junto com a falta de ar, como pressão alta, palpitação e dor no peito.
"A primeira coisa a fazer é detectar e tratar a disfunção que está causando
os sintomas. O problema pode estar nas válvulas, nos vasos ou no próprio
músculo cardíaco", orienta Ferreira.
Excesso de peso
Para quem ainda resiste em tachar a obesidade de doença, leia esta: pesquisas
mostram que ela acaba com o fôlego por motivos bem fisiológicos. "A
barriga espreme os pulmões, limitando sua capacidade de trabalho", diz
Marcia Pizzichini, professora da Universidade Federal de Santa Catarina. Pior:
há indícios de que o tecido gorduroso que fica no ventre fabrica substâncias
inflamatórias capazes de agravar problemas respiratórios, como a asma. Sem
falar que quilos a mais baixam a imunidade, colaborando, sem querer, para
infecções. A mensagem é curta: busque emagrecer ou se manter no peso ideal.
Refluxo gastroesofágico
Ele é motivado pela volta constante de comida do estômago para o esôfago e
seus
principais sintomas são regurgitação, queimação e uma forte dor no peito —
muitas vezes, esse incômodo é confundido até com infarto, dada a sua
intensidade. A falta de ar, bem como pigarro, rouquidão e tosse, são algumas
das manifestações mais atípicas do refluxo. "O retorno da massa alimentar
irrita as paredes do esôfago. Um dos reflexos disso são espasmos involuntários
nos pulmões, capazes de tirar o fôlego", conta o gastroenterologista Ary
Nasi, do Fleury Medicina e Saúde. Em crianças e idosos, o conteúdo regurgitado
pode até vazar para a dupla de órgãos que capitaneiam o sistema respiratório.
"E isso, por sua vez, atrapalha o trabalho dos brônquios",
complementa Nasi, que também é membro da Federação Brasileira de
Gastroenterologia. O tratamento do refluxo atua em três frentes: diagnóstico
adequado, por meio de endoscopias, mudanças alimentares, como o menor consumo
de comidas gordurosas, e medicamentos. Se todas as etapas forem cumpridas, é
bem provável que o refluxo — e a falta de ar — desapareça.
Problemas no diafragma
Um dos principais responsáveis pela respiração, o músculo que faz a divisão do
peito e do abdômen também pode ficar com defeitos, embora isso seja bem raro.
Na chamada eventração, o diafragma invade o tórax e deixa de realizar sua
função, cortando o fôlego. Tumores, hérnias, lesões nos nervos e rupturas do
tecido muscular também repercutem no diafragma, pressionando os pulmões. Por
serem situações não tão frequentes, quando alguém chega ao hospital com falta
de ar, os médicos investigam primeiro as causas mais habituais, como doenças
respiratórias e cardíacas. "Descartados os principais suspeitos,
começamos a investigar esses outros motivos", esclarece Nasi.