Organismo feminino tem menos água e por isso demora
mais para metabolizar a bebida
Embora o maior consumo de álcool sempre tenha sido
atribuído aos homens, nos últimos anos, as mulheres têm aumentado
significativamente seu uso tanto na quantidade como em relação à frequência.
Um estudo publicado na BMJ Open em 2016 mostrou que, em um século, essa
diferença entre homens e mulheres tem diminuído. No início do século 20, os homens
apresentavam risco 3,6 vezes maior de sofrer consequências negativas
relacionadas ao consumo nocivo de álcool do que as mulheres. Esse número
diminuiu para 1,3 vez no início do século 21.
No Brasil, o mais recente Relatório Global sobre
Álcool e Saúde, da Organização Mundial da Saúde (OMS), demonstra essa mesma
tendência. Em 2010, 5,2% das mulheres reportaram o uso de álcool no padrão
Beber Pesado Episódico (BPE), quando é ingerida grande quantidade de álcool
em curto período de tempo. Em 2016, esse índice subiu para 6,9%. Vale ressaltar
que este padrão de consumo está associado a diversos problemas agudos, como
acidentes, violência e amnésia alcoólica, além de prejuízos de longo prazo.
É alarmante notar que essa mudança de padrões tem
ocorrido também entre as adolescentes. A Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar
(PeNSE) de 2015 (IBGE, 2016), com alunos do 9º ano do ensino fundamental (entre
13 e 15 anos), indicou que, tanto a experimentação quanto o consumo atual de
bebidas alcoólicas (nos 30 dias que antecederam a pesquisa), foram maiores
entre as meninas para a experimentação (56,1% frente a 54,8% entre os meninos)
e para o consumo atual (25,1% contra 22,5%).
Mulheres são mais sensíveis
"As mulheres, em especial, são mais sensíveis
aos efeitos do álcool devido a diversos fatores como, por exemplo, os menores
níveis das enzimas metabolizadoras do álcool e menor quantidade de água no
organismo".
Os dados preocupam. Essa tendência à equiparação no consumo
de álcool poderá representar desigualdade nos resultados para a saúde, pois as
mulheres são mais sensíveis aos efeitos dessa substância do que os homens
devido a diferenças na composição biológica entre os sexos. Um dos motivos é a
menor quantidade de água presente no corpo feminino, o que faz com que o álcool
fique muito mais concentrado em seu organismo. Além disso, também apresenta
menores níveis das enzimas que metabolizam o álcool, demorando mais para
eliminá-lo do organismo.
Isso faz com que, quando consumidas as mesmas
quantidades de bebidas alcoólicas que os homens, elas apresentem níveis mais
elevados de álcool no sangue e demorem mais tempo para metabolizá-lo, ou seja,
os efeitos iniciam mais rapidamente e tendem a ser mais duradouros. Com isso,
elas têm maior probabilidade de ter problemas relacionados ao álcool
(dependência e outros danos à saúde) com níveis de consumo mais baixos e/ou em
idade mais precoce do que os homens.
Acredito que as transformações do papel da mulher
nas últimas décadas possam explicar a tendência de se igualarem aos homens em
relação a comportamentos vistos anteriormente como masculinos, como o consumo
de álcool em padrões mais pesados. Outros fatores que podem influenciar neste
aumento são: estresse da dupla jornada de trabalho, conquista de melhores
condições socioeconômicas, maior convivência com homens bebedores, maior
aceitação social do uso, entre outros.
Um problema de saúde pública
Em suma, o uso pesado de álcool tem implicações
relevantes em termos de saúde pública, pois está associado a riscos para a
saúde e a consequências sociais, não só ao bebedor, mas também àqueles que
estão próximos a ele. Por isso, como médico e pesquisador da área, creio que
políticas de prevenção futuras devam contemplar os padrões mais pesados de
consumo de bebidas alcoólicas, independente do gênero, visando reduzir os
prejuízos causados por esse tipo de comportamento.
Fonte: https://www.minhavida.com.br/saude/materias/15414-abuso-de-alcool-pode-ter-impacto-maior-na-saude-das-mulheres
- Escrito por Arthur Guerra de Andrade